28 de fevereiro de 2011

Sentirei saudades, Tio João!



Áh... como é difícil dizer adeus.
Como dói ter que se despedir de alguém, quando tudo o que queremos é a sua companhia.
Mais difícil ainda é ter que seguir em frente sem aquela presença que tanto nos fazia bem.
A morte é assim. Nos arranca, bruscamente, um pedaço de nós. Nos priva de um pouco mais de felicidade.
Áh... como eu gostaria que aqueles que amo vivessem eternamente. Como seria bom reviver todos momentos de alegria simples e gratuita... os abraços, os afagos e os aprendizados.
Sei que jamais saberei lidar com a perda e com a dor que ela me causa. Jamais estarei com o coração em paz ao ver alguém que amo partir. Mas, graças a Deus, existe algo que me consola: acreditar que um reencontro é possível, e em um mundo muito melhor. Onde não precisaremos, nunca, nos despedir. Onde poderemos abraçar aqueles a quem queremos bem sempre que sentirmos vontade. É neste mundo diferente e tranqüilo que quero encontrar aqueles que já perdi... Um mundo onde iremos acordar com uma manhã ensolarada batendo à nossa janela; onde passaremos a tarde à sombra de uma árvore e onde sentiremos a chegada da noite, anunciada por uma brisa tão leve quanto o sopro de Deus.
Só esta “certeza” que não me deixa desabar, mesmo perdendo aqueles que me alicerçam.

20 de fevereiro de 2011

- Tô aqui viu?!

Chovia muito naquela tarde. Quando olhou pela janela do seu apartamento, teve a sensação de estar isolada do mundo. Era como se uma enorme cortina branca estivesse envolvendo o seu prédio, o seu apartamento e os seus olhos. Tentou forçar, mas foi inútil! Era impossível conseguir enxergar alguma coisa por trás daquela tempestade.
Encheu a sua caneca rosa com um café novinho e se preparou para curtir uma preguiça no sofá da sala. E quando começou a desfrutar dos prazeres daquela tarde ociosa ouviu o toque da realidade chamar, o celular.
- Oi?!
- Bruninha?!
- Fala, Peuzinho!
- Bruninha, to precisando de você... tem como você vir aqui na praça da matriz?
- Na praça da matriz, Peuzinho?!
- É!
- Mas com essa chuva? Você está na praça da matriz com essa chuva?!
- Estou... e preciso de você aqui.
- Aconteceu alguma coisa?!
- Aconteceu... e eu preciso muito de você!
- Tá... me espera aí que eu “tô” chegando!
E desligou... enquanto trocava de roupa começou a pensar em qual seria o problema. Choveram idéias (ruins) em sua cabeça, mas mesmo acreditando que todas eram possíveis, decidiu não se apegar a nenhuma.
- Nada de sofrer por antecedência, Bruna! – disse para si mesma. – Daqui alguns minutos você vai saber o que está havendo.
Amarrou o cabelo e saiu. Dando graças a Deus porque sabia nadar!
Ao chegar na praça, viu seu amigo sentado perto da fonte. Preocupou-se, pois nunca o vira daquele jeito... sozinho, de cabeça baixa, sobre uma chuva forte que insistia em cair. Aproximou-se dele lentamente, sentou-se ao seu lado e tocou o seu ombro.
Nesse momento, ele levantou sua cabeça e ao encarar o horizonte, deixou que ela percebesse que estava chorando. Ao olhá-la só conseguiu dizer uma frase:
- Eu sabia que você viria, Bruninha! – e a abraçou.
- Eu não iria te abandonar agora.
Com uma voz embargada ela resolveu perguntar o que estava acontecendo e ele, com essa mesma voz, lhe contou.
Ficaram ali por algumas horas e quando perceberam já tinha parado de chover.
- A vida é assim mesmo, Peuzinho. Como essa tempestade que caiu. Às vezes sofremos tanto que acreditamos que esse caos vai durar para sempre. Mas quando menos esperamos, a dor vai embora e tudo começa a voltar ao normal.
- Será mesmo, Bruninha?! Será que isso vai passar?!
- Você confia em mim?!
- Claro!
- Então acredite... vai passar! Só não sei quanto tempo vai demorar. – disse tocando o seu cabelo ensopado.
- Olha, Peuzinho... eu não posso dizer que você vai estar bem amanhã... mas posso garantir outra coisa...
- O que?!
- Que eu estarei ao seu lado!


Este foi um sonho que tive na noite passada. O amigo a quem me referi, o Peuzinho, ele existe mesmo. E agradeço a Deus todos os dias por isso.
Talvez ele ainda não saiba o quanto é importante, para mim, tê-lo entre os meus amigos. Porque, para mim, ele não é qualquer um... é um amigo de verdade.
Eu sempre acreditei, desde pequena, que existem pessoas na nossa história que são tão fundamentais, que não podemos dizer o nosso nome sem que a gente se lembre do dela.
E identificamos essas pessoas essenciais, nos momentos de muita tristeza ou naqueles de muita alegria. Esses dois extremos são capazes de nos revelar quem amamos de verdade.
Quando estamos alegres demais, quem gostaríamos que estivesse do nosso lado, vendo as mesmas coisas que nós??? Ou quando estamos tristes demais, quem gostaríamos estivesse ali, segurando a nossa mão???
Ao respondermos essas duas perguntas, conseguimos identificar os nossos amigos verdadeiros.
Eu o conheço (Peu) há muito tempo. E confesso que não sei dizer com exatidão como e porque nos tornamos companheiros. E é sempre assim, a gente nunca sabe dizer o porquê resolvemos devotar esse amor sem condições à alguém.
Talvez seja porque tenha tido uma sensibilidade maior, que os outros não tiveram... talvez porque olharam para nós de um jeito mais aperfeiçoado, com mais paciência e mais calma.
Há amigos que vão ficar para o resto da vida. São aqueles que mesmo aborrecidos ou amargurados eu sei, que na hora em que eu precisar, estarão ao meu lado.
Só por isso suportamos os defeitos alheios. Porque sabemos que mesmo que estejamos na miséria, ele não irá me abandonar.
Amigo verdadeiro é aquele que não impõe condição para o amor. É aquele que o é, aconteça o que acontecer.
É aquela velha história: eu briguei com você... eu fiz tudo errado... eu te tratei mal... fui injusto... mas se de repente, no meio da noite eu me sintir só, você é a primeira pessoa para quem eu tenho vontade de ligar. Isso sim é amor... é amizade. Não há condições. Eu não tenho medo de que o outro não vá me receber, eu não tenho medo que o outro vá me tratar do mesmo jeito que eu o tratei... eu não tenho medo de que o outro vá ter resistência a mim, não! O amor que eu sei que ele guarda por mim me dá coragem de ligar no meio da noite e dizer:


- Eu preciso de você agora... mesmo que você não tenha tido a oportunidade de me ter ao seu lado no momento em que você precisava.


Isso é ser e ter um amigo de verdade.
É quando não depende do tempo, de quantas ligações foram feitas, de quantas vezes fomos atrás, não. O laço que permanece independe do tempo, da atenção devotada.
E hoje quero terminar esse texto de uma forma diferente; vou encerrá-lo com uma frase que, certamente, tem o poder de repercutir em quem é amado. E que talvez quem ame nem saiba o quanto.
O efeito é tamanho pois, ao ouvi-la, recebemos a oportunidade de experimentarmos a misericórdia. Acho que viver misericórdia pelo lado dos fortes não tem lá muita vantagem. Dureza é quando temos que vivê-la pelo lado dos fracos. Quando somos nós que precisamos ser amados, ajudados. Quando somos nós que saímos do nosso lugar para pedir ajuda.
E aí, neste momento, sabemos que tudo poderá ser resolvido com aquela presença nos assegura... que não muda... que está sempre ali.
É por isso que quero dizer para você, Peuzinho, e para todos aqueles que sabem que são meus amigos:


- Eu tô aqui viu?!


Eu não faço estardalhaço, não faço muito barulho, não dou muita notícia, mas eu estou aqui!
O tempo vai passar, as coisas ficarão diferentes... pode ser que eu não tenha a oportunidade de estar aí, de chegar a tempo para te socorrer, mas eu estou aqui... e sempre estarei!

19 de fevereiro de 2011


"Há uma coisa que eu não entendo sobre a vida...
Você conhece tantas pessoas...
E aí surge uma pessoa e sua vida muda... para sempre..."

15 de fevereiro de 2011

Estou esperando por você!

Hoje eu só queria lhe dizer que senti a sua falta. Ou melhor, sinto. Diariamente.
Hoje eu só quero que tenha a certeza de que eu jamais o esqueci, apesar da distância que nos separa.
Sempre trago comigo esse aperto no peito, esse nó na garganta que às vezes estrangula o meu ar.
Ah... como eu já tentei abandonar essa saudade! Como eu já tentei arrancá-la de mim!
Hoje eu já nem tento mais, já me dei por vencida. Já me convenci de que é impossível não sentir a sua falta, porque é igualmente impossível tirá-lo do meu coração, da minha vida, da minha memória.
Não queria dizer isso, mas você já é parte de mim!
Sabe, para ser bem sincera, nem eu mesma me dei conta de quando isso aconteceu. Quando percebi você já era essencial.
Hoje não tenho muito mais o que fazer senão esperar. Esperar e desejar que tudo aquilo que sonhamos, ou planejamos, realmente aconteça.
O mundo dá muitas voltas e prefiro acreditar que ele nos dará outra chance.
Posso até estar enganada, mas acredito que é só isso o que nos falta, uma oportunidade.
E enquanto a espero, sigo rezando e pedindo a Deus para que esse dia não demore muito a chegar.
Não vejo a hora de abraçá-lo novamente... mas não qualquer abraço. Quero aquele da última vez... que tem o poder de me fazer acreditar que estamos a sós no mundo inteiro.
Quero também poder tocar o seu rosto e sentir o calor da sua pele. Quero o seu beijo mais doce, o mais apaixonado. Quero perder a noção do tempo andando por aí de mãos dadas com você... quero reviver o que ficou para trás e construir um futuro ao seu lado.
Isso é tudo o que desejo e se preciso for, sou capaz de esperar a vida inteira para estar de novo ao seu lado... a única coisa que peço é que, dessa vez, seja para sempre!


"Não existiria som se não houvesse o silêncio
Não haveria luz se não fosse a escuridão
A vida é mesmo assim: dia e noite, não e sim
Cada voz que canta o amor não diz tudo o que quer dizer
Tudo o que cala fala mais alto ao coração
Silenciosamente eu te falo com paixão
Eu te amo calado, como quem ouve uma sinfonia
de silêncio e de luz
Nós somos medo e desejo
Somos feitos de silêncio e som
Tem certas coisas que eu não sei dizer (e digo)."
(Certas coisas - Lulu Santos)

5 de fevereiro de 2011

O desafio do "Te amo"

O desafio do "Te amo" foi criado pelo Rafael (do blog (De letras a sentimentos). A proposta é é criar o movimento do Eu Te Amo. Quantas vezes queremos dizer te amo a uma pessoa, que por medo, timidez, não conseguimos dizer. Esse movimento é mais ou menos como o filme "Corrente do Bem", onde um jovem decide ajudar 3 pessoas e essas deveriam fazer o mesmo com mais 3 pessoas cada. No final, o movimento estaria espalhado por todo o mundo.



Então os meus "Eu te amo" vão para:
Letícia (Diário de bordo)


Jaheb (Jaheb Castro)

3 de fevereiro de 2011

Viva o desapego!



Há muito tempo que vejo por aí algumas pessoas se aconselhando mutuamente a praticarem o “desapego”. Curiosa acerca deste assunto resolvi então pesquisá-lo.
Primeiramente recorri ao velho “pai-dos-burros”, o dicionário, para ter certeza de que compreendia o sentido dessa palavra.
Eis o achado:

Desapego s.m. : falta de apego; desafeição, desamor; desinteresse.


Após estar certa de que entendia corretamente o seu significado, comecei a questionar-me qual seria o motivo para incentivarmos o desamor e o desinteresse alheio. E sem querer acreditar na falta de afeto humana supus que existiria alguma outra justificativa consistente para tal fato.
Felizmente descobri, durante as minhas buscas pela internet, que o “desapego” é um dos mais importantes ensinamentos budistas. Mas para eles, ser desapegado não é sinônimo de indiferença, desinteresse ou fuga, como afirma o “Aurélio”.
Muito pelo contrário! Os seguidores do budismo não são encorajados a desviarem-se dos problemas, mas sim a encará-los de frente. Pelo visto, praticar o desapego não se trata de ignorar a vida, mas de sabermos qual é a hora certa de nos desprendermos daquilo que já é passado, dos fatos que não são mais concretos. Ao entender essa filosofia, ficou fácil perceber que a maioria dos nossos problemas são oriundos dessa nossa traiçoeira mania.
Ser apegado é atestar que não existe em nós a compreensão de que a vida, e o mundo, estão em constante mutação. E sendo assim, não há como não sofrermos! Se o mundo gira, devemos acompanhar o seu ritmo e não permanecermos estagnados.
Sofremos excessivamente pelo apego ao dinheiro, às nossas posses ou à nossa pobreza, à beleza e às nossas aptidões ou até mesmo a falta delas. Mas para mim, apegar-se às pessoas é ainda mais devastador.
O apego é um jeito estranho de amar. É um amor que ultrapassa os limites que deveria.
Estranho porque amar alguém, ao meu ver, significa sabermos qual é o limite, até onde nós podemos ou não podemos ir. Em outras palavras, vivermos a experiência do cuidado, já que esta é a melhor forma de se demonstrar um amor.
As palavra muitas vezes tem o poder de seduzir aqueles que a ouvem, mas a concretização definitiva do amor se dá na experiência do cuidado, no momento em que elegemos alguém para cuidar.
Tenho convicção de que, embora com nomes diferentes, cuidar e amar são necessariamente a mesma coisa. Um é a expressão constante do outro. E é nessa mistura de cuidado e de amor, que somos moldados, transformados naquilo que somos.
Mas veja bem! Este cuidado não deve ser excessivo, com a finalidade de evitarmos invasões desnecessárias.
Amar é também descobrir as modalidades do afeto. É saber ser firme e amoroso ao mesmo tempo. O apego é uma desordem dessas modalidades. É a vontade de ultrapassar o espaço que não é seu. E muitas vezes, nessa ilusão de que amar é sermos dono do outro, acabamos tomando um território que não nos pertence.
O fato de nos relacionarmos não condiz com a idéia de cedermos o que é individual. Há muito em nós que deve ser preservado, e mais, temos esse direito pois não deixamos de ser uma pessoa!
Apegar-se, nada mais é do que invadirmos espaços que não são nossos e acreditarmos na ilusão de que nós bastamos àquela pessoa. É termos a convicção de que ela não precisa de mais ninguém. Ou então o contrário, nos apegamos tanto ao outro, que passamos a acreditar que ele é a solução de todos os nossos problemas. Criamos a ilusão de que o outro preenche tanto os espaços dos nossos corações, dos nossos afetos, que passamos a crer que não precisamos de mais ninguém.
E não é segredo para ninguém, que uma relação desordenada repele as outras. Quem se apega não admite a aproximação de outras pessoas àquela a quem se apegou.
Se temos um amigo que nos sufoca, que começa a nos privar da companhia dos outros amigos que temos, que tenta ser mais importante em nossas vidas do que nós mesmos, é preciso tomar cuidado!
Ou então, se começamos a identificar que não mais estamos dando importância àquilo que tem, que uma pessoa está se tornando o pólo, o foco da nossa atenção, cuidado maior ainda! Pois, continuar a alimentar esse relacionamento é garantia de um sofrimento futuro.
Eu já vivi essa situação e posso dizer o quanto dói apegar-se demais a uma pessoa e transformá-la na pessoa mais importante da sua vida.
Todos nós temos o direito de termos os nossos amigos e amores; temos o direito de elege-los e até de dizer quem são eles. O que não podemos é colocar sobre os ombros dessas pessoas a responsabilidade de ser toda a fonte de afeto que nós precisamos na vida. Caso contrário esse apego nos matará e matará também a quem nos ama... e, somente nesse caso, o amor nos fará mal, ao invés de nos fazer bem.
Portanto, que amemos mais e sempre. Mas que não nos esqueçamos do desapego.


"Quando o sol brilha, desfrute-o; quando a chuva cai, desfrute-a Todas as coisas nesta vida – deixe que venham e deixe que se vão." **


(**Buda)

2 de fevereiro de 2011

Meme Literário



Recebi esse Meme por indicação da Ana Tereza, do blog "Deixa a alma respirar", do qual sou fã.

Ana, muitíssimo obrigada por ter se lembrado de mim e do "Entrelinhas e palavras"! Tenha certeza de que fiquei imensamente honrada por ser lembrada por quem tanto admiro!


E o que tenho que fazer é o seguinte:
Pense numa cena, ou numa frase ou 'conjunto de frases' ou uma personagem (homem ou mulher) que te marcou/ te impressionou/ te fez suspirar/ te fez refletir em um livro que leu e gostou. Pode ser o livro que você está lendo agora, ou qualquer outro livro que já tenha lido. Depois disso, você vai procurar na internet um ilustração/figura que mais representa essa cena/frase deste livro. Não esqueça de indicar qual é o livro que vocês está citando e os créditos da imagem.

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"(...) Laila chegou a abrir a boca para dizer alguma coisa. Não que achasse que a mãe não tinha razão. Sabia muito bem que aqueles dias de inocência, quando podia ficar tranqüilamente brincando com Tariq pelas ruas, tinham terminado. Já há algum tempo, vinha percebendo algo diferente no ar sempre que os dois saiam juntos em público. Podia sentir que as pessoas olhavam para eles, reparavam neles, cochichavam a seu respeito, e não notava nada disso antes. E talvez continuasse a não notar, mesmo agora, se não fosse por um detalhe fundamental: tinha se apaixonado por Tariq. Estava loucamente apaixonada, e sem qualquer esperança.

(...)Quando elas já tinham retirado os pratos, levado tudo para a cozinha e começado aquele frenesi de preparar o chá, tendo que lembrar quem preferia verde, quem preferia preto, Tariq fez um gesto com a cabeça, indicando a porta, e saiu.
Laila esperou uns cinco minutos e foi atrás dele.
Encontrou-o três casas adiante, recostado na parede, na entrada de um beco estreito que separava duas construções. Estava cantarolando uma velha canção pashto, de Ustad Awal Mir:

Da ze ma ziba watan,
Da ze ma dada watan.
Esta é a nossa linda terra,
Esta é a nossa terra amada.

E estava fumando, mais um novo hábito adquirido com os rapazes com quem Laila o tinha visto recentemente. Ela simplesmente não suportava aqueles novos amigos de Tariq. Todos se vestiam do mesmo jeito, de calça folgada e camiseta justa que deixavam bem visíveis seus braços e seu peito. Todos usavam muita colônia, e todos fumavam. Circulavam pela vizinhança em grupos, fazendo piadas, rindo alto, às vezes até mexendo com as garotas com aquele mesmo sorrisinho idiota no rosto. Um dos amigos de Tariq insistia em ser chamado de Rambo, por causa de uma ligeiríssima semelhança com Sylvester Stallone.
— Sua mãe o mataria se soubesse que está fumando — disse Laila, olhando para um lado e para o outro antes de entrar no beco.
— Só que ela não sabe — retrucou ele, recuando para deixá-la passar.
— Mas poderia vir a saber.
— E quem vai contar a ela? Você?
— Pode contar seus segredos ao vento, mas, depois, não vá culpá-lo por contar tudo às árvores — disse a menina, batendo com o pé no chão.
— Quem disse isso? — indagou Tariq, sorrindo e erguendo a sobrancelha.
— Khalil Gibran.
— Você é uma exibida!
— Me dê um cigarro.
Ele fez que não com a cabeça e cruzou os braços. Este era um novo item do seu repertório de poses: recostado na parede, de braços cruzados, com um cigarro pendendo do canto da boca e a perna boa meio dobrada, com um ar descontraído.
— Por que não?
— Não é legal para você — disse ele.
— Mas é para você?
— Faço isso por causa das garotas.
— Que garotas?
— Elas acham que é sexy — respondeu ele, todo prosa.
— Não é mesmo.
— Não?
— Garanto que não.
— Não é sexy?
— Você fica parecendo um khila, um retardado.
— Uau, e precisa ser tão dura? — retrucou ele.
— De qualquer forma, que garotas são essas?
— Hmmm, você está com ciúme.
— Eu, não. Não estou nem aí... É só curiosidade.
— As duas coisas ao mesmo tempo? Impossível! — observou ele, dando uma tragada no cigarro e apertando os olhos por causa da fumaça.
— Aposto que estão falando de nós.
Laila podia ouvir a voz da mãe, dizendo: "É como segurar um mainá. Basta soltar um pouco as mãos e pronto: ele sai voando." Sentiu uma pontada de culpa, mas, depois, calou a voz da mãe e preferiu saborear o jeito como Tariq tinha pronunciado a palavra nós. Vindo dele, parecia ate alguma coisa emocionante, conspiratória. E era tão tranqüilizador ouvi-lo dizer aquilo assim, num tom espontâneo, natural... Nós. Era como reconhecer a ligação entre ambos, cristalizá-la.
— Dizendo o quê?
— Que estamos navegando pelo rio do pecado — respondeu ele.
— Comendo um pedaço do bolo da imoralidade.
— Andando no riquixá da depravação — acrescentou Laila, entrando na brincadeira.
— Preparando a qurma do sacrilégio.
E os dois caíram na risada. De repente, Tariq notou que o cabelo dela estava crescendo.
— Está bonito — disse ele.
— Você esta mudando de assunto — retrucou Laila, torcendo para não ficar vermelha.
— Que assunto?
— Aquelas meninas de cabeça oca que acham você sexy.
— Ora, você sabe muito bem.
— Sabe o quê?
— Que só me interesso por você.

(...) — Comprei um revólver — disse ele um dia. Estavam sentados no chão do quintal da casa de Laila, debaixo da pereira. E lhe mostrou a arma. Era uma Beretta, semi-automática. Para a menina, ela parecia simplesmente preta e mortal.
— Não gosto disso — observou ela. — As armas me assustam.
— Na semana passada, encontraram três corpos numa casa em Karteh-Seh — disse ele, girando o tambor da arma para abri-lo. — Você ficou sabendo? Eram irmãs. As três foram estupradas. E tiveram a garganta cortada. Alguém arrancou com os dentes os anéis que elas tinham nos dedos. Deu para saber por causa das marcas...
— Prefiro não ouvir essas coisas.
— Não queria que você se aborrecesse — disse Tariq. — E só que... Eu me sinto melhor tendo isso comigo.
— Você seria capaz? — perguntou Laila.
— De quê?
— De usar essa coisa. De matar com ela.
O rapaz enfiou o revólver na cintura da calça e disse algo a um só tempo maravilhoso e terrível.
— Por você — respondeu ele. — Eu usaria isso para matar alguém por você, Laila.
Ele chegou mais perto e suas mãos se tocaram uma vez, e outra mais. Quando, com alguma hesitação, os dedos de Tariq tentaram segurar os seus, ela deixou. E quando ele se inclinou subitamente e encostou os lábios nos seus, ela também deixou.
Aquele beijo ali debaixo de uma árvore não podia fazer mal algum. Era uma coisinha à toa. Uma indulgência facilmente desculpável. Então, deixou que Tariq a beijasse e, quando ele se afastou, Laila se inclinou para beijá-lo, com o coração aos pulos, o rosto ardendo, um fogo queimando por dentro (...)."




(A cidade do sol – Khaled Hosseini)



"A Cidade do Sol" me impressionou muito, já que conta, de forma delicada, uma linda história de amor que nasceu e sobreviveu ao caos. É uma leitura deliciosa, já que mescla (com muita originalidade) fatos bastante rudes com uma linguagem extremamente doce.



Vale conferir!

1 de fevereiro de 2011


"São duas notícias. Uma boa e outra ruim.

A boa é que isso passa... a ruim é que demora!"