15 de dezembro de 2011

Foi assim a primeira vez que eu o vi. Abrimos as nossas portas exatamente no mesmo segundo, como se tivéssemos ensaiado isso durante anos. E quando eu olhei para o alto (porque ele devia ter quase uns dois metros de altura) e vi aquele cabelo preto caindo sobre os seus olhos mais negros ainda tive uma certeza: “Ou é casado, ou tem namorada, ou é gay!”. Obviamente um homem como aquele não estaria sozinho. E olha que eu nem sabia do seu gosto pelos Beatles, Roberto Carlos e Almodóvar. Fiquei parada na porta do meu apartamento sem saber se o cumprimentava, sem saber se me apresentava, sem saber se eu, algum dia, iria conseguir parar de olhá-lo. Mas o que aconteceu foi que as minhas dúvidas e a minha mania de sempre tentar achar uma lógica para tudo, me impediram de dizer o meu primeiro “Bom dia, Vizinho!”.
Sem nem olhar para frente, ou para mim (como queiram) ele se foi. Com uma pressa incompreensível para uma preguiçosa manhã de segunda-feira.
Fui trabalhar com aquela cena na cabeça e, nem por um segundo, consegui esquecer a sua testa franzindo ao não conseguir fechar a porta. Não sei explicar, mas a partir desse dia, a única coisa que eu desejava era o seu abraço.
Eu estava bem sozinha. Fazia uns dois anos que tinha terminado um namoro de longa data e, desde então, passei a me sentir melhor desacompanhada. Era bom sentir-me livre e ter mais tempo para gastar entre os meus amigos. Depois de tanto tempo me sentindo presa, me afastando aos poucos de tudo aquilo que eu amava, era bom voltar a viver sem a sensação de estar perdendo algo precioso.
Acho que por isso essas coisas de amor e paixão não faziam mais parte dos meus planos. Definitivamente, eu não queria sofrer pelos próximos dez anos.
Bom, preciso admitir que eu já não era mais a mesma pessoa. Aquele meu romantismo e a vontade de viver “um amor cinematográfico” foram desaparecendo, à medida que as minhas expectativas foram sendo frustradas. “Melhor assim!” – eu pensava – “Vou evitar dores de cabeça”.
Hoje vejo o quanto fui infantil, imatura. Bastou a vida me dar uma rasteira para eu cruzar meus braços “emburrada” e desistir daquilo que sempre acreditei. Bastaram-me algumas lágrimas para que eu me tornasse a pessoa mais cética e amargurada do mundo.
É engraçado como as coisas acontecem em nossas vidas. No momento em que eu estava mais convicta de que era numa nova “Lívia”, meu mundo virou do avesso. E mais engraçado ainda é que, para que isso acontecesse, não foi preciso muita coisa. Ou melhor, quase nada. Para mim foi suficiente olhá-lo. Sentir o cheiro de banho recém tomado. Perceber a sua impaciência pelo franzir da sua testa (risos).
Foi assim que aconteceu. Nenhuma palavra dita, nenhuma troca de olhares, nenhuma jogada de charme, nenhuma segunda intenção, nada! Mas me apaixonei por ele assim que o vi.
Eu não estava preparada para viver aquilo e até achava que não queria, mas tudo foi se tornando inevitável. E chegou um dia em que eu não conseguia mais ficar sem vê-lo (mesmo que fosse pela fresta deixada pela porta entreaberta do seu apartamento, nas noites de sexta-feira, quando saía e voltava apressado para buscar algo que havia esquecido). O pior é que para ele eu não existia. “Deus, como eu podia estar apaixonada por alguém que sequer sabe que eu existo?” Era o que eu perguntava sempre que sonhava e desejava a sua companhia.
Perdi muito tempo sonhando acordada com o vizinho do 202. Até que resolvi tomar uma atitude, mesmo sem saber ao certo qual seria. Gastei o dia tentando adivinhar qual roupa deveria vestir, qual o melhor jeito de pentear o meu cabelo, qual perfume deveria usar. Ensaiei mil e um discursos na frente do espelho, tentei calibrar a minha voz para que não parecesse estridente ou melodiosa demais. E como se não bastasse, ainda precisava de um motivo para chamá-lo.
Fiquei quase cinco minuto parada em frente a minha porta naquele “vou”, “não vou”... sentindo um frio na barriga, o coração bater mais rápido e mais forte a cada passo que eu dava em direção à porta da frente. Por fim levei a mão a campanhinha e toquei. Toquei e me lembrei de que era noite de sexta-feira e que ele não estaria em casa. Abaixei a cabeça sem acreditar como eu poderia ter me esquecido desse detalhe e quando abri meus olhos ele estava lá, bem na minha frente. Levei um susto quando o vi tão perto e acho que acabei por assustá-lo também. E sabe aqueles ensaios em frente ao espelho?! De nada adiantaram porque eu não consegui dizer uma palavra sequer. Eu só consegui sorrir. E acho que foi o sorriso mais sincero da minha vida. E só depois de vê-lo sorrir em retribuição foi que consegui me apresentar. Inventei de última hora que a lâmpada do meu quarto havia queimado e ele, gentilmente, se ofereceu para trocá-la. E em troca eu lhe dei o amor mais verdadeiro e a promessa de sermos felizes juntos.
Amanhã faz onze anos que nos casamos. E mesmo depois de tanto tempo, quando acordo pela manhã e o vejo ao meu lado, sinto meu coração bater como no dia em que o vi pela primeira vez. Eu não tenho certeza de nada em minha vida, exceto uma coisa...
...que quero passar o resto dos meus dias ao seu lado.



12 de dezembro de 2011

Estive pensando sobre as pessoas. Sobre mim, sobre você, sobre esta multidão de desconhecidos que nos rodeia... Enfim, pensei na existência de uma forma geral e em como viver essencialmente pode ser complicado.
Quando digo “essencialmente”, me refiro a sermos fieis a nós mesmos, à nossa personalidade e princípios, à nossa essência. O ruim é que nem sempre isso é possível, por uma infinidade de motivos.
Acho que todos nós, ao menos uma vez, já fizemos algo contra a nossa vontade pelo simples fato de acharmos que tal atitude agradaria alguém. Ou o contrário. Isso é ser desonesto consigo mesmo ou seria apenas generosidade, altruísmo?
Não sei ao certo definir.
A única coisa que sei é que, no momento em que deixamos de viver conforme o que verdadeiramente somos, morremos um pouco por dentro.
É como se despedaçássemos nossa alma e, diariamente, jogássemos um pedacinho dela ao léu.
Ainda acredito na bondade das pessoas, por mais que a vida teime em me provar o contrário. Acredito que podemos sim abrir mão de muitas coisas em prol da felicidade alheia. E admiro quem faz isso! Mas até que ponto?
É louvável fazer o bem, fazer ou ser a felicidade de alguém. Eu só não acredito na felicidade daqueles que se anulam.
Apenas porque ninguém consegue ser feliz quando não se sente confortável em si mesmo, quando frustra suas próprias expectativas.
É claro que podemos abrir mão de muitas coisas por uma causa que nos pareça maior, mas desde quando isso nos faça bem, nos faça completos.
Preservar o que somos pode ser mais complicado do que possamos imaginar. Mais complicado e mais doloroso também. Mas nem por isso devemos deixar de arriscar!
Afinal, precisamos nos edificar, nos completar.
Mais que isso...
Precisamos crescer!